terça-feira, 29 de março de 2016

As ideias fora da realidade ou a corrupção e fraude na excelência do impeachment

A tradição lusa relegou como herança ao contemporâneo algumas das características que tornaram o Brasil, Brasil: educação metafísica e patriarcado.
A primeira tornou-nos um povo dado a teorias, princípios em abstrato, a teses desencarnadas do plano do real, do material. Importa muito mais as “belas ideias” que suas possibilidades práticas, discursos efêmeros com poucas práticas eficientes e eficazes. O amor à teoria de belas explanações e possibilidades infinitas de um paraíso irrefletido nas práticas.
A segunda herança fez com que em nome dos ideais fossemos capazes de nos lançar aos mais algozes poderes do pai, do chefe, do branco, do homem, do heterossexual, do capital. Diante deste poder inconteste do patriarca e de seus desejos nos submetemos a ordem idealizada de família hierarquizada para sobreviver em meio a uma realidade múltipla e em devir majoritária no plano real e minoritária no plano das ideias; e aos negócios escusos do chefe em nome da ordem. Cativos do senhor de escravos o empresariado do grande capital tornou-se donos dos corpos e das mentes no lar e para além dele, nos remetemos a ideias e ideais que apenas amenizam nossas dores cotidianas de explorados e expropriados via legal e por corrupção.
Este o ponto onde o passado encontra o presente ou o futuro com o passado no atual embate entre liberais (PSDB, DEM entre outros) e os que tentam ser socialdemocratas (PT e outros mais) aflora a corrupção com listas que parecem metralhadora giratória que põe a nú a realidade da corrupção tornada rotina burocrática, como o fora o extermínio nazista da Segunda Grande Guerra.
Os fatos que nos cercam demonstram que somos uma “democracia colonial”, em uma linha interpretativa tradicional, poderia ser designada de teoria da dependência de FHC. Neste campo, entre o patriarca dono de escravos – empregados sem direitos trabalhistas, sem segurança no emprego ou condições dignas de trabalho em meio a precarização crescente e a dependência do favor da família para manter-se – e o líder partidário do século XXI, vemos renascer o coronel truculento nas práticas legislativas e no judiciário e o patrão que quer controlar o voto de seus “apaniguados”, como se isto não fosse suficiente, em meio aos aplausos dos que defendem a “liberdade” em via pública.
Mas, por livre, leia-se e entenda-se liberalismo pós-neoliberal econômico temperado pelo sentimento patriarcal colonial escravocrata, ou seja, redução de direitos sociais e civis onde as primeiras vítimas serão os pobres, as mulheres, os negros, os homossexuais e tantos outros capazes de exercer a liberdade social para além da econômica – enquanto liberdade face ao destino dos costumes. Assim, os que defendem a liberdade na praça pública nada mais querem que o retorno do antigo privilégio de serem os únicos atendidos por recursos do Estado a juros ínfimos enquanto ao povo nada caberia se não o trabalho.
Nesta sopa de ideias e ideologias vemos o quanto as ideias estão fora do plano real. O discurso de combate a corrupção visa apenas a ampliação dos lucros da iniciativa privada, em especial do grande capital, sobretudo daquela alijada pelos atuais “donos do Estado” questionados em sua legitimidade de poder. A meta é apossar-se dos recursos do Estado para outro grupo, aquele fora do poder de Estado, com outra concepção de Estado e Sociedade, mesmo que o preço seja o golpe contra democracia legítima via judiciário como esteio de evidências legitimadas.
No mesmo plano, a fala de Lula de que o combate a corrupção – até aqui limitada quase exclusivamente ao PT e aliados, onde a lista com mais de duzentos nomes ocultada pelo sigilo de processo é apenas meio para se por sob suspeita, ainda maior, a impessoalidade da aplicação da lei – seria a responsável pela crise econômica não reconhece dois fatos, em nome das ideias que controlam as mentes e corações. A paralisia econômica deve-se a nossa dependência do mercado internacional, em crise desde 2008 – crise que colocou fim ao neoliberalismo, mas o que se inaugurou ainda não se configurou de forma explícita em termos de doutrina econômica – e isto consolidaria a teoria da dependência de FHC –  que seria a única política-econômica que nos caberia.

Outro elemento explicativo da crise não é a investigação da corrupção, mas a crise da rotina da corrupção. A corrupção vista como fato social, no Brasil, quer dos políticos ou das iniciativas privadas indo do grande ao pequeno capital em conformidade ao poder político que a circunda, demonstrou-se uma prática suprapartidária que coloca em questão a própria república e seus representantes, de liberais a socialdemocratas. A rotina da corrupção posta em cheque, sobretudo diante da leniência do grande capital, colocou os empresários atônitos ao contágio coletivo que poderia causar e os fez cessar no investimento produtivo, mesmo dizendo que tudo se deve aos altos impostos, apenas; como se fosse apenas?
Assim, a economia não parou apenas pela dependência internacional, mas por fatores próprios ao Brasil, naquilo que o torna Brasil, as ideias abstratas de que partidos poderiam corresponder a quadrilhas e políticos, possivelmente, a criminosos organizados, foram materializada fazendo o escândalo para inglês ver. A rotina da corrupção fazia as engrenagens andar de forma azeitada por todos os naipes políticos e do grande capital, “cessada” esta rotina que ia do mensalão, para se votar no “projeto Brasil do PT”, às obras públicas, restou ao país encolher economicamente com milhões de famintos desempregados.
O que coloca outra questão, e decisiva no que torna o Brasil, Brasil; a disputa é pelo fim da corrupção ou pelo monopólio da corrupção ou pela alternância na corrupção? As ideias fora da realidade demonstram que o importante não é o combate a corrupção, mas, a imposição de seu projeto social-político-econômico em detrimento do outro, sem que com isto, se extirpe a rotina da corrupção? A Itália de Berluscone, após mãos limpas, que o diga. E, não apenas. A questão é qual corrupção interessa investigar e qual preocupa manter os olhos da justiça fechdados?
Para ficar apenas em mais uma tese típica dos cientistas políticos do PSDB, a defesa da ideia de que a condições econômicas determinam a eleição está posta em cheque neste terceiro turno, uma vez que até o segundo turno a crise não se demostrava com a força que agora notamos pelos números negativos inegáveis face a crise econômica-política da corrupção. Resta saber se combinaram com o povo que não aparece em todo seu fulgor nas ruas. Ah! Sim! O povo é apenas mais uma ideia fora da realidade!
E tudo isto confirma apenas uma tese: o grande capital, este orbita ao redor dos governo federal e alguns estaduais, não se envergam perante o Estado, compram tudo que lhes interessa de reeleição presidencial com reforma Constitucional a partidos e candidatos que se lançaram como baluartes da ética e da defesa do povo brasileiro?
Que os juízes e os políticos honestos nos salvem!          

domingo, 20 de março de 2016

“O negócio do impeachment”: os últimos dias do governo Dilma

Apenas para lembrar alguns traços históricos; nos EUA os presidentes tendem a ser assassinados quando rejeitados socialmente e pelos políticos; no Brasil, a tendência seria o suicídio ou a renúncia, além de se perpetuar no poder por acordos?
Parto do princípio que todos os corruptos devem ser investigados, julgados com isenção – palavra tão linda de significado profundíssimo e tão banalizada nas práticas brasileiras, do jornalismo à ação de juízes e promotores, além de professores e pesquisadores acadêmicos – e condenados a penas compatíveis com as evidências dos crimes. Mais que isto, sou favorável à ampliação da pena por crime conexo, do tipo, desvio de hospital, deve ser julgado por assassinatos; e assim iria. Os crimes de corrupção no Estado e do Estado deveriam ter as penas mais severas e exemplares.
Assim, não me coloco a questão das possibilidades de corrupção via PT, DEM, PMDB ou PSDSB e os possíveis bilhões desviados, isto é lugar comum, ao menos para os minimamente críticos e não cegos pela militância ou por defesa de ideais outros que no plano da realidade são incompatíveis com a corrupção?
Coloco a questão das razões, dos determinantes sociais, para além da corrupção, que levam ao impedimento da Presidenta Dilma, dos valores ou interesses que podem guiar alguns dos principais atores deste processo histórico que poderá vir a ser impar, se expandido para todos os partidos – o que até agora não ocorreu; e marcar um novo capítulo da história.
A FIESP, e suas parceiras, por exemplo, mais que o impedimento da presidenta, deseja o avanço da flexibilização das leis trabalhistas e a reforma da previdência. No que diz respeito a primeira questão, leia-se redução dos direitos trabalhistas e mesmo, se for possível, a inexistência de leis que protejam o trabalhador. No segundo quesito quer-se a ampliação da idade de aposentadoria que teria duplo fim: após investir anos de aperfeiçoamento profissional a pessoa pode se aposentar, em média, aos 55 anos; é muito cedo para a lógica da exploração capitalista. Após anos de investimentos, e com o avanço da indústria farmacêutica e médica a pessoa vivendo mais anos, deveria ser igualmente explorada por mais anos. Nada de “ócio criativo”; deve-se aposentar quando se for uma espécie de “bagaço humano”, sem possibilidades de investir em projetos pessoais outros que não o servir o patrão de modo assalariado. Ou pior, do ponto de vista da exploração capitalista, aposentar uma vez e continuar trabalhando o que possibilitaria algum tipo de acúmulo de renda o que não caberia aos trabalhadores, detentores apenas da força de trabalho. Neste ponto Dilma tergiversou e ofereceu a carteira de trabalho em proposta teórica para reforma e com ela a idade de aposentadoria. Mas, foi pouco.
Com as togas o que mais preocupava os atores da justiça era a demanda por transparência e teto salarial nos cargos. A transparência salarial com sua publicidade ampla a irrestrita, não incomoda apenas a toga, mas servidoress públicos em geral e políticos, pois, causa escárnio o salário de alguns poucos marajás do serviço público, que gozam ainda do direito a aposentadoria integral e auxílios mil diante da média salarial da iniciativa privada que sustenta o Estado. Em outros termos, aqueles que deveriam ser servidores, mas são nobres em um Estado que deveria primar pelos valores republicanos e democráticos, para muito além do entendimento da liberdade, igualdade e fraternidade maçônica. Para muitos ver o salário estampado nas redes sociais é motivo de perseguição pois, afinal, seguem a regra, primeiro o meu; depois o teu, no caso, o direito a educação, saúde e segurança, entre outros elementos, de forma pública e gratuita e de qualidade. E, na contramão desta noção, sobretudo os professores se vêm com salários indignos da humanidade que são e que representam e constroem, no presente para o futuro, sem contar as péssimas condições de trabalho.

Num outro vértice, vem o embate das consciências entre o religioso-político que tanto primou até ao final da Inquisição e o político-religioso que propõe as liberdades do Estado laico e liberdade ecumênica de religião. Entre as gravações tornadas públicas da Lava-jato, uma fala chama atenção neste quesito, a do prefeito do Rio de Janeiro com Lula que diz: “Eles (investigadores da Lava-jato?) são todos crentes”. Temos, neste ponto, outro projeto paralelo ao do Estado laico (político-religioso), na demanda pelo Estado “Teocrátio”, espero que seja entre aspas (o religioso-político). Assim, o projeto ganharia para a cena o presidente da Câmara dos Deputados, principal homem preocupado com o impedimento da presidenta, e seria uma derrocada para muitos avanços das mulheres, das religiões milenares de tradição africana, e para os LGBTs. Ficarei apenas no quesito mulher, dentre as relações de gênero. Vencendo o impedimento, seria aprovada nova lei de atendimento a mulher estuprada e esta passaria mais uma vez a ser duas vezes vítima, pois, teria, antes de ser atendida no serviço de saúde pública, de provar que foi estuprada. Além disto, a pílula do dia seguinte teria sua comercialização proibida. Entre outras questões propaladas por algumas religiões.
A aprovação da CPMF, por sua vez, equivaleria a quebra de sigilo bancário e facilitaria ao Imposto de Renda comprovar as fraudes nas declarações. Mais que isto, faria com que Igrejas, Institutos e Fundações, além de ONGs e OSCIPs, entre tantas outras formas de organizações que se isentam de impostos, contribuíssem. Em meio a imposto obrigatória e a impossibilidade de se furtar ao imposto de renda, sem ser pego na malha fina, todas  as grandes fortunas e mesmo as médias e pequenas foram contra mais um imposto em meio ao oceano de corrupção.

Para encerrar este texto uso a frase do Paulinho da Força Sindical, também pego em gravação, “O impedimento só ta acontecendo por causa do Eduardo Cunha” – contra o qual não tem nenhuma denúncia até o momento?. A outra frase é lapidar para entender-se o processo histórico: “Tem muita gente querendo financiar esse negócio do impedimento”. Neste contexto de pessoas honestas e valores altos, de alto poder e renda (não conta você que recebe menos de 15 mil por mês e não tem patrimônio superior a cinco milhões), sou apenas mais um estre muitos que vive numa residência tão pequena que para eles, os corruptos, poderia ser comparada a casinha dos cachorros e, pior que isto, nem seria, eu, o professor com doutorado da iniciativa privada, o cachorro, mas os restos por este deixado, tamanho o fosso deixado entre nós, os humanos comuns, e estas fraudes que nos desafiam a construir um novo Brasil.