A tradição
lusa relegou como herança ao contemporâneo algumas das características que
tornaram o Brasil, Brasil: educação metafísica e patriarcado.
A primeira
tornou-nos um povo dado a teorias, princípios em abstrato, a teses
desencarnadas do plano do real, do material. Importa muito mais as “belas
ideias” que suas possibilidades práticas, discursos efêmeros com poucas
práticas eficientes e eficazes. O amor à teoria de belas explanações e
possibilidades infinitas de um paraíso irrefletido nas práticas.
A segunda
herança fez com que em nome dos ideais fossemos capazes de nos lançar aos mais
algozes poderes do pai, do chefe, do branco, do homem, do heterossexual, do
capital. Diante deste poder inconteste do patriarca e de seus desejos nos
submetemos a ordem idealizada de família hierarquizada para sobreviver em meio
a uma realidade múltipla e em devir majoritária no plano real e minoritária no
plano das ideias; e aos negócios escusos do chefe em nome da ordem. Cativos do
senhor de escravos o empresariado do grande capital tornou-se donos dos corpos
e das mentes no lar e para além dele, nos remetemos a ideias e ideais que
apenas amenizam nossas dores cotidianas de explorados e expropriados via legal
e por corrupção.
Este o ponto
onde o passado encontra o presente ou o futuro com o passado no atual embate
entre liberais (PSDB, DEM entre outros) e os que tentam ser socialdemocratas
(PT e outros mais) aflora a corrupção com listas que parecem metralhadora
giratória que põe a nú a realidade da corrupção tornada rotina burocrática,
como o fora o extermínio nazista da Segunda Grande Guerra.
Os fatos que
nos cercam demonstram que somos uma “democracia colonial”, em uma linha
interpretativa tradicional, poderia ser designada de teoria da dependência de
FHC. Neste campo, entre o patriarca dono de escravos – empregados sem direitos
trabalhistas, sem segurança no emprego ou condições dignas de trabalho em meio
a precarização crescente e a dependência do favor da família para manter-se – e
o líder partidário do século XXI, vemos renascer o coronel truculento nas
práticas legislativas e no judiciário e o patrão que quer controlar o voto de
seus “apaniguados”, como se isto não fosse suficiente, em meio aos aplausos dos
que defendem a “liberdade” em via pública.
Mas, por
livre, leia-se e entenda-se liberalismo pós-neoliberal econômico temperado pelo
sentimento patriarcal colonial escravocrata, ou seja, redução de direitos
sociais e civis onde as primeiras vítimas serão os pobres, as mulheres, os
negros, os homossexuais e tantos outros capazes de exercer a liberdade social
para além da econômica – enquanto liberdade face ao destino dos costumes.
Assim, os que defendem a liberdade na praça pública nada mais querem que o retorno
do antigo privilégio de serem os únicos atendidos por recursos do Estado a
juros ínfimos enquanto ao povo nada caberia se não o trabalho.
Nesta sopa de
ideias e ideologias vemos o quanto as ideias estão fora do plano real. O
discurso de combate a corrupção visa apenas a ampliação dos lucros da
iniciativa privada, em especial do grande capital, sobretudo daquela alijada
pelos atuais “donos do Estado” questionados em sua legitimidade de poder. A
meta é apossar-se dos recursos do Estado para outro grupo, aquele fora do poder
de Estado, com outra concepção de Estado e Sociedade, mesmo que o preço seja o
golpe contra democracia legítima via judiciário como esteio de evidências legitimadas.
No mesmo
plano, a fala de Lula de que o combate a corrupção – até aqui limitada quase exclusivamente
ao PT e aliados, onde a lista com mais de duzentos nomes ocultada pelo sigilo
de processo é apenas meio para se por sob suspeita, ainda maior, a
impessoalidade da aplicação da lei – seria a responsável pela crise econômica
não reconhece dois fatos, em nome das ideias que controlam as mentes e
corações. A paralisia econômica deve-se a nossa dependência do mercado
internacional, em crise desde 2008 – crise que colocou fim ao neoliberalismo,
mas o que se inaugurou ainda não se configurou de forma explícita em termos de
doutrina econômica – e isto consolidaria a teoria da dependência de FHC – que seria a única política-econômica que nos
caberia.

Outro elemento
explicativo da crise não é a investigação da corrupção, mas a crise da rotina
da corrupção. A corrupção vista como fato social, no Brasil, quer dos políticos
ou das iniciativas privadas indo do grande ao pequeno capital em conformidade ao
poder político que a circunda, demonstrou-se uma prática suprapartidária que
coloca em questão a própria república e seus representantes, de liberais a
socialdemocratas. A rotina da corrupção posta em cheque, sobretudo diante da
leniência do grande capital, colocou os empresários atônitos ao contágio
coletivo que poderia causar e os fez cessar no investimento produtivo, mesmo
dizendo que tudo se deve aos altos impostos, apenas; como se fosse apenas?
Assim, a
economia não parou apenas pela dependência internacional, mas por fatores
próprios ao Brasil, naquilo que o torna Brasil, as ideias abstratas de que
partidos poderiam corresponder a quadrilhas e políticos, possivelmente, a
criminosos organizados, foram materializada fazendo o escândalo para inglês
ver. A rotina da corrupção fazia as engrenagens andar de forma azeitada por
todos os naipes políticos e do grande capital, “cessada” esta rotina que ia do
mensalão, para se votar no “projeto Brasil do PT”, às obras públicas, restou ao
país encolher economicamente com milhões de famintos desempregados.
O que coloca
outra questão, e decisiva no que torna o Brasil, Brasil; a disputa é pelo fim
da corrupção ou pelo monopólio da corrupção ou pela alternância na corrupção? As
ideias fora da realidade demonstram que o importante não é o combate a
corrupção, mas, a imposição de seu projeto social-político-econômico em
detrimento do outro, sem que com isto, se extirpe a rotina da corrupção? A
Itália de Berluscone, após mãos limpas, que o diga. E, não apenas. A questão é
qual corrupção interessa investigar e qual preocupa manter os olhos da justiça
fechdados?
Para ficar
apenas em mais uma tese típica dos cientistas políticos do PSDB, a defesa da
ideia de que a condições econômicas determinam a eleição está posta em cheque
neste terceiro turno, uma vez que até o segundo turno a crise não se demostrava
com a força que agora notamos pelos números negativos inegáveis face a crise
econômica-política da corrupção. Resta saber se combinaram com o povo que não
aparece em todo seu fulgor nas ruas. Ah! Sim! O povo é apenas mais uma ideia
fora da realidade!
E tudo isto
confirma apenas uma tese: o grande capital, este orbita ao redor dos governo
federal e alguns estaduais, não se envergam perante o Estado, compram tudo que
lhes interessa de reeleição presidencial com reforma Constitucional a partidos
e candidatos que se lançaram como baluartes da ética e da defesa do povo
brasileiro?
Que os juízes e os políticos honestos nos
salvem!