sábado, 20 de dezembro de 2014

A arte de envelhecer no século XXI

“Faculdade de Ciências Nervosas” é um conto sobre a arte de envelhecer. Quanto mais ancião, mais esta palavra ganha urgência em ser substituída pela vida vivida. A premência da existência só dá a ver a quem dela se percebe em fuga. Contrariado.
Fosse à primeira metade do século XX, esta “h”istória causaria pudor e arrepios nos velhos de 44 anos sentados na varanda aguardando a vida passar nos dias finais e, por vezes, terminais. Sentado na varanda, acalentando sonhos dos netos e dos filhos e não os próprios. E, quem ousasse ir contra a “história natural dos fatos”, sobretudo, mulheres, seria coagido socialmente a resignar-se ou ser execrado.
Hoje, a beleza da história de 69 anos é rara aos de quem tem 19. Só os amantes de antiquários para saber o quanto se ganha ou se perde com a idade. A história única e traz em si o gosto da existência primitiva da do processo de humanização e individuação que apenas a poucos pode dizer a si mesmo, em primeira mão, e, depois em público, quem se é sem vergonha de ser.
Basta ser num tempo onde o único é cada vez mais raro mesmo na obra de arte. Sobreviveu apenas o antiquário com as peças raras no formato de obra prima repetida na unicidade de suas existências.
É isto que os 19 anos encontram nos 69. A mulher emancipada, dona de seu corpo e de seu desejo, desavergonhada de suas carnes e de seus gemidos na esperança de em um átimo conter o que juventude perdeu nos anos de existência.
A mulher Celena é tudo, menos afoita. Isto os anos consumiram, mas lhe deram a urgência de viver. Neste ponto são os dois jovens amantes que se interpenetram na busca do gozo de viver.
Ganha mais o jovem ou a fogueteira? Ganha a vida sem travas de idades, sem limites na inquietude. Ganha o jovem nas lições de lençol, ganha a anciã no calor dos braços jovens, ganha a vida com a esperança de eternizar-se num gozo que não tem fim.
“Faculdade de Ciências Nervosas” é um convite para se tomar ciência da vida, das faculdades mentais que a torna mais bela, dos nervos que se abrem para o real, do entretenimento dos amantes que confabulam sonhos irrefletidos diante dos dias.
Parabéns, Raúl Otuzi Oliveira por mostrar o quanto os admirados de antiquário apreciam a arte da existência.

Wlaumir Souza

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