Como era de se
esperar a trajetória de Renato J. Ribeiro foi breve no MEC. Homem das letras e
das ideias críticas e emancipatórias não tinha como sobreviver em meio a um
legislativo federal composto majoritariamente por conservadores de todos os
naipes; alguns beirando e atuando de modo reacionário.
O Brasil
legislativo acostumado a ministros que alteram a forma do ensino e quase nada
faz no debate e discussão do conteúdo, se assustou diante de um ministro do
vulto de Ribeiro que, entre outros temas, colocou no centro do debate público,
sem subterfúgios que escamoteiam as intenções mais profundas, as questões do
ensino de gênero e de religião na Educação.
Era o objetivo
do ministro que estes conhecimentos e saberes ficassem à luz das ciências e das
filosofias e não do prisma criacionista que tanto tem movido votos e falas
reacionárias. Algo hercúleo visto que o modus operandi do Brasil desde a
ocupação portuguesa foi a educação abaixo da fé quando se implementou por estas
terras o que pela Europa era criticado: a cristandade e o padroado. Este modelo
colonizador fincou raízes profundas que se evidenciam até hoje nos embates
públicos do que deveria ser laico.
Como já havia
escrito em “A crise entre preços e valores”, em 14/09/2015, a exoneração de
Renato Janine Ribeiro era previsível em meio às demandas que têm como
representante máximo o Presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha e seu
séquito de ideias carcomidas e com práticas postas sob suspeita em meio as
denúncias vindas da Suiça. Mais um “salvador da pátria” que cai em descrédito
diante da sociedade laica das mídias sociais?
Outrora a voz mais
alardeada neste embate entre o secular e o sagrado na política partidária era a
de Feliciano, por São Paulo, entre outros tipos de igual naipe reacionário
espalhados pelo Brasil e sufragados para o legislativo. Todavia, estes, de certo
modo, caíram no ridículo social pelo conteúdo e forma do que defendiam. Era
reacionário demais para uma sociedade que se aventura no mundo pós-moderno a
contragosto dos conservadores e reacionários.
A queda de uns
é a ascensão de outros. Evidenciou-se uma nova estrela do pensamento
reacionário, o Deputado Eduardo Cunha eleito, em tese, principalmente via voto
religiosa da Igreja Assembleia de Deus – que, segundo a acusação, teria lavado
dinheiro de propina do mesmo. Não por acaso este não entra em querelas diante
de repórteres da tradicional indústria cultural, pois seu discurso tenderia a
cair em descrédito diante da maioria da população. O Estatuto da Família, a (de)(re)forma
eleitoral contrária a opinião publica são aapenas o início de um projeto político-ideológico
muito maior e, por isto, para evitar os erros dos similares Feliciano,
Bolsonaro, entre outros apela-se para o discurso profissional de advogados.
Assim, ficamos
diante de um fato, a crise política que arrasta o país para uma de suas maiores
crises econômicas é fruto do desejo de reformar os costumes dos outros via
modelo religioso, onde, talvez, nem Jesus Cristo se encaixaria como família; sobretudo
se utilizássemos a contraversão como teoria explicativa: teria Jesus Cristo
sido concebido por um soldado romano que estuprou Maria de Nazaré?
Esse projeto
político-religioso que não tergiversa com a pluralidade e a diversidade real da
humanidade, e defendida pela ciência contemporânea, em nome de doutrinas
idealizadas que só são reais nas mentes de seus aliados, às vezes, por motivos
eleitorais e ou eleitoreiros, terminaria por tornar legal preconceitos e
discriminações que reduzem os direitos de cidadania dos outros contrários a
identidade forjada pelas doutrinas conservadoras e/ou reacionárias. Assistimos
isto no ocidente recentemente no nazismo e no fascismo que ainda encontram
condições sociais para se reproduzir com uma educação formal limitada de
racionalidade e emancipação em favor do pensamento mágico de muitos professores
com pouca ou nenhuma formação acadêmica sobre as ciências das religiões.
Neste
contexto, barrada a votação dos vetos presidenciais, restava à Presidenta da
República laica demitir o ministro pós-moderno em um País que resiste a entrar
na modernidade com discurso científico e práticas e teorias críticas no que dia
respeito a religião – um dos maiores cabos eleitorais na contemporaneidade. E,
para fazer mais do mesmo, lançou mão do loteamento de cargos típica das velhas
políticas. Neste modus operandi quase se desfez em uma noite quase tudo que
levou o país ao descrédito internacional e a uma onde de desemprego até agora
sem fim previsto. Afinal, o que são corpos famintos diante da salvação da alma?
Apenas uma parte do purgar diante das escolhas de outros que nada sofrem com
crises econômicas no cotidiano.
A laicidade
republica tergiversa ao fazer acordo com o Vaticano pelo ensino religioso, foge
ao (em)debate ao substituir um ministro crítico e emancipador aclamado pelos
progressistas de todos os naipes, até mesmo por parte da oposição “ilustrada”,
em nome de um ministro que colocará tudo nos eixos eleitorais ao atuar nas
questões quantitativas e não qualitativas.
Nossa crise é
de projetos e valores que se traduzem em preços? O preço da propina com oração
agradecendo a Deus pela “benção recebida”? Os políticos que se revelam cada vez
mais caso de polícia e não de política ou políticas, mas com poder para esmagar
os projetos outros? Enquanto no estrelato da fortuna política de salários e
gratificações e privilégios típicos da “nobreza de Estado” a crise não os
alcança, nos andares bem abaixo, um em cada cinco lares há desemprego total. Mas,
em comum, muitos, dos lados todos, com as mãos molhadas? Passados mais de cinco
séculos do início do padroado na Terra Brasilis os embates entre fé e razão,
crença e ciência ainda movimenta os bastidores da política mesmo que os corpos
paguem em benefício da alma e a educação seja a imolada?
Nenhum comentário:
Postar um comentário