terça-feira, 13 de outubro de 2015

A tragédia dos costumes em meio à crise político-econômica no Brasil

Como era de se esperar a trajetória de Renato J. Ribeiro foi breve no MEC. Homem das letras e das ideias críticas e emancipatórias não tinha como sobreviver em meio a um legislativo federal composto majoritariamente por conservadores de todos os naipes; alguns beirando e atuando de modo reacionário.
O Brasil legislativo acostumado a ministros que alteram a forma do ensino e quase nada faz no debate e discussão do conteúdo, se assustou diante de um ministro do vulto de Ribeiro que, entre outros temas, colocou no centro do debate público, sem subterfúgios que escamoteiam as intenções mais profundas, as questões do ensino de gênero e de religião na Educação.
Era o objetivo do ministro que estes conhecimentos e saberes ficassem à luz das ciências e das filosofias e não do prisma criacionista que tanto tem movido votos e falas reacionárias. Algo hercúleo visto que o modus operandi do Brasil desde a ocupação portuguesa foi a educação abaixo da fé quando se implementou por estas terras o que pela Europa era criticado: a cristandade e o padroado. Este modelo colonizador fincou raízes profundas que se evidenciam até hoje nos embates públicos do que deveria ser laico.
Como já havia escrito em “A crise entre preços e valores”, em 14/09/2015, a exoneração de Renato Janine Ribeiro era previsível em meio às demandas que têm como representante máximo o Presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha e seu séquito de ideias carcomidas e com práticas postas sob suspeita em meio as denúncias vindas da Suiça. Mais um “salvador da pátria” que cai em descrédito diante da sociedade laica das mídias sociais?
Outrora a voz mais alardeada neste embate entre o secular e o sagrado na política partidária era a de Feliciano, por São Paulo, entre outros tipos de igual naipe reacionário espalhados pelo Brasil e sufragados para o legislativo. Todavia, estes, de certo modo, caíram no ridículo social pelo conteúdo e forma do que defendiam. Era reacionário demais para uma sociedade que se aventura no mundo pós-moderno a contragosto dos conservadores e reacionários.
A queda de uns é a ascensão de outros. Evidenciou-se uma nova estrela do pensamento reacionário, o Deputado Eduardo Cunha eleito, em tese, principalmente via voto religiosa da Igreja Assembleia de Deus – que, segundo a acusação, teria lavado dinheiro de propina do mesmo. Não por acaso este não entra em querelas diante de repórteres da tradicional indústria cultural, pois seu discurso tenderia a cair em descrédito diante da maioria da população. O Estatuto da Família, a (de)(re)forma eleitoral contrária a opinião publica são aapenas o início de um projeto político-ideológico muito maior e, por isto, para evitar os erros dos similares Feliciano, Bolsonaro, entre outros apela-se para o discurso profissional de advogados.
Assim, ficamos diante de um fato, a crise política que arrasta o país para uma de suas maiores crises econômicas é fruto do desejo de reformar os costumes dos outros via modelo religioso, onde, talvez, nem Jesus Cristo se encaixaria como família; sobretudo se utilizássemos a contraversão como teoria explicativa: teria Jesus Cristo sido concebido por um soldado romano que estuprou Maria de Nazaré?
Esse projeto político-religioso que não tergiversa com a pluralidade e a diversidade real da humanidade, e defendida pela ciência contemporânea, em nome de doutrinas idealizadas que só são reais nas mentes de seus aliados, às vezes, por motivos eleitorais e ou eleitoreiros, terminaria por tornar legal preconceitos e discriminações que reduzem os direitos de cidadania dos outros contrários a identidade forjada pelas doutrinas conservadoras e/ou reacionárias. Assistimos isto no ocidente recentemente no nazismo e no fascismo que ainda encontram condições sociais para se reproduzir com uma educação formal limitada de racionalidade e emancipação em favor do pensamento mágico de muitos professores com pouca ou nenhuma formação acadêmica sobre as ciências das religiões.
Neste contexto, barrada a votação dos vetos presidenciais, restava à Presidenta da República laica demitir o ministro pós-moderno em um País que resiste a entrar na modernidade com discurso científico e práticas e teorias críticas no que dia respeito a religião – um dos maiores cabos eleitorais na contemporaneidade. E, para fazer mais do mesmo, lançou mão do loteamento de cargos típica das velhas políticas. Neste modus operandi quase se desfez em uma noite quase tudo que levou o país ao descrédito internacional e a uma onde de desemprego até agora sem fim previsto. Afinal, o que são corpos famintos diante da salvação da alma? Apenas uma parte do purgar diante das escolhas de outros que nada sofrem com crises econômicas no cotidiano.

A laicidade republica tergiversa ao fazer acordo com o Vaticano pelo ensino religioso, foge ao (em)debate ao substituir um ministro crítico e emancipador aclamado pelos progressistas de todos os naipes, até mesmo por parte da oposição “ilustrada”, em nome de um ministro que colocará tudo nos eixos eleitorais ao atuar nas questões quantitativas e não qualitativas.

Nossa crise é de projetos e valores que se traduzem em preços? O preço da propina com oração agradecendo a Deus pela “benção recebida”? Os políticos que se revelam cada vez mais caso de polícia e não de política ou políticas, mas com poder para esmagar os projetos outros? Enquanto no estrelato da fortuna política de salários e gratificações e privilégios típicos da “nobreza de Estado” a crise não os alcança, nos andares bem abaixo, um em cada cinco lares há desemprego total. Mas, em comum, muitos, dos lados todos, com as mãos molhadas? Passados mais de cinco séculos do início do padroado na Terra Brasilis os embates entre fé e razão, crença e ciência ainda movimenta os bastidores da política mesmo que os corpos paguem em benefício da alma e a educação seja a imolada?

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