sábado, 15 de março de 2014

Copa do mundo como espelho dos Brasis ou como garis, Black blocs e tantos mais enfrentam os herdeiros do mandonismo

              Wlaumir Souza.              
              No período áureo do café, os imigrantes europeus perceberam que havia uma época propícia para demandas não atendidas no formato de greves: o período da colheita. Algo aparentemente evidente foi construído ao longo de anos de experiência e sob influência anarquista. Diante do fruto maduro o cafeicultor tinha de tergiversar de algum modo e com ele o Estado oligárquico que se propagandeava como república democrática.
            Semelhantemente, os garis e tantos outros se conscientizaram que estão diante da maior colheita do país das últimas décadas: a Copa do Mundo e as Olimpíadas ensaiadas pelos grandes eventos que as precede, entre elas o carnaval. A greve em meio à festa é o que de pior pode acontecer a um governo ou empresa privada diante dos olhos do mundo postos sobre o País sede dos mega eventos. Assim como outrora era a greve em meio à colheita. Os ácratas de outrora se personificam agora nos Black blocs.


            Se as manifestações de 2013 prenunciaram as demandas por uma democracia de fato e um novo modo de inserção, do Brasil, no capitalismo internacional., a subserviência político-econômica que se traduz no empobrecimento da população – via inflação, preço do dólar, alta de juros e proteção da indústria nacional – com direito de corrupção no varejo chegou ao limite. Contrariamente do que esperavam as elites deletérias, a educação formal de baixa qualidade não impediu o avanço da consciência social e política que poderá se transformar, em médio prazo, em consciência de classe. Neste ponto, de uma consciência que se desperta, o escracho político foi reintroduzido como pauta da manifestação, em seus mais variados tons.
Mais do que depor governantes, visto que o modelo de representação via executivo de coalizão torna isto quase impossível, onde a exceção – Collor com livre trânsito político no Brasil atual – comprova a regra; a tentativa é via ironia, charge, caricatura, piada e outras formas – até violentas de desobediência civil – de denúncia, evidenciar a falta de credibilidade do político ou das políticas adotadas. No jargão geral, o assassinato de reputação via contradição da imagem vendida fartamente – inclusive com verba pública – com a execução do mundo real vistos a olhos nus.
Neste ponto, toda e qualquer cidade que se vê como sede dos eventos ou das confederações da copa, entre elas Ribeirão Preto, pode esperar muitas manifestações e greves comparando a situação do Brasil e de Ribeirão Preto, em particular, com a dos países mais ricos. A situação de apoio que o esporte, a educação e a assistência básica recebem naqueles países em contradição com a realidade local será fartamente denunciada e discutida. Buracos pintados serão apenas uma das visões cotidianas, caso a promessa de maquiar as cidades – tapar buracos, pacificação, mobilidade entre outros – não se cumpra.
O futebol via escracho, mais do que ser  impedido ou boicotado, será o palanque de denúncia com holofotes do mundo alardeando a contradição entre a festa da classe média alta nos estádios e o povo na rua clamando pelo básico. Será o escracho do futebol como meio de dominação e controle que se ampliará se o Estado e o mercado não estiverem preparados para responderem rapidamente de modo radicalmente democrático.
        Mais que isto, as demandas via anarquismo atual no modelo Black bloc afirma as instituições representativas democráticas como esgarçadas pelo filhotismo, apadrinhamento, cooptação, familismo, clientelismo e outros mecanismos da velha política que não se foram.
A vitória dos garis, no Rio de Janeiro, em meio a greve, face ao carnaval, onde o sindicato foi posto para escanteio nas reivindicações e organização do movimento grevista diante de sua imperícia no representar os seus associados é apenas o sintoma de um movimento muito maior de questionamento da legitimidade das instituições democráticas e da representatividade.

Os sindicatos pelegos – entre eles o melhor exemplo seria o dos professores de São Paulo que mesmo diante dos docentes desejarem manter a greve a diretoria a encerrou? – sentem-se acoçados por novas lideranças sociais e trabalhistas. Estas evidenciam que com os velhos modos de governar, fazer política e sindicalizar não mais é possível dialogar, mas, antes, tornou-se necessário falir com o conforto destes em nome de uma nova ordem legítima de poder.
Teremos uma copa com parte da classe média vaiando os governantes no estádios enquanto a outra parte tentará gerar um apagão com todos os eletrodomésticos ligados durante os jogos, a população trabalhadora fazendo greve, e os Black blocs fazendo o espetáculo da destruição da e na praça pública que não se alça realmente a democracia almejada pelas massas.

No contexto destes insatisfeitos com o modelo de inserção no capitalismo internacional, enquanto país subalterno que fornece mão de obra barata e consome produtos internacionais mais caros para subsidiar duplamente o consumo dos países centrais do capitalismo e manter viva a indústria nacional, a copa é o evento que possibilita a resposta pública das querelas internas com base na divisão internacional do trabalho. Protestar na copa é uma exigência para que os financiadores e patrocinadores do sistema-mundo vejam que o modelo encontra opositores dispostos não a romper com a ordem de um Brasil que fica entre a sexta e a sétima posição na produção de riquezas, mas, se necessário for, aturdi-la com a realidade de ser um dos últimos em distribuição dos dividendos sociais, políticos e econômicos à nação.

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