sábado, 19 de outubro de 2013

Do machismo quase (nada) cordial

Do machismo quase (nada) cordial

Postado em 30 de Janeiro de 2012 às 11:01 na categoria Caleidoscópio
Por Wlaumir Doniseti de Souza **

Crodoaldo Valério (Marcelo Serrado) personagem da novela “Fina estampa”, o Crô, tem suscitado as mais diferentes posições quanto ao modo como o homossexual é retratado na televisão. Nada de novo! A cada novo programa com um(a) personagem LGBTTs vem à baila o debate do quanto contribui para a aceitação/tolerância/exclusão/perseguição à comunidade homoafetiva.
crocro
Para pensar a “questão Crô”, um grupo de homens – heterossexuais –, em programa de rádio em Ribeirão Preto, criticou a visão estereotipada do gay no folhetim e do risco disto aos seres humanos em questão no cotidiano. Em outros termos, do quanto os estereótipos poderiam gerar maior violência, a famigerada homofobia.
 O interessante era que os debatedores “não percebiam” que valorizam outro estereótipo,  o do gay de classe média que para ser tolerado à convivência se submete e reproduz em  público o comportamento dominante heteronormativo e, por vezes, reproduzindo a exclusão de outros gays. Destarte, o grupo heterossexual – em sua boa vontade – reproduzia a exclusão que criticavam em outro naipe, o do machismo (quase) cordial. Ou seja, tolera-se o gay desde que cumpra as regras do grupo dominante com um comportamento que aparente a heteronormalidade. É exatamente isto que o personagem Crô não faz. 
Os debatedores se prestassem atenção ao símbolo do Movimento Gay, o arco-íris, perceberiam que busca representar a fluidez das formas de manifestação humana, e mesmo animal, de sexo e da afetividade.  Deste ponto de vista, o Crô personagem faz parte de um mundo real violentamente negado quer pela força física dos machões de plantão, quer pela força simbólica dos machistas (quase) cordiais.
Mesmo parte da “Comunidade” Gay critica a forma “Crô” de ser. Isto evidencia como o comportamento sexual dominante é o do macho dominante com as mais diferentes implicações nas práticas sexuais e afetivas mesmo de parte dos LGBTTs que interiorizaram a cosmovisão dominante do macho heterosseuxal. Assim, o machismo tem seguidores mesmo nas fileiras gays. Para se ter uma idéia disto basta pensar o fato de que gays “discretos” tendem a não conviver em público com os gays “assumidos”.
Os debatedores salientavam o fato da novela, escrita por um gay, prestar um desserviço a Comunidade LGBTTs. Todavia, o que não perceberam era que, também eles, prestavam um desserviço ao criticar a “feminilidade” do personagem. Traduzindo em miúdos o que seria ou é feminino seria inferior. 
Por outro lado, é de se notar que pouco ou nada se fala de outro estereótipo na novela – no machão hipermasculinizado (dominador, violento, excludente, isolado, solitário e, por vezes, dado a bebedeira) – Baltazar. Este, sim, um risco social às mulheres.
 Para finalizar, uso uma frase de Bertold Brecht: “Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas, ninguém chama violentas as margens que o comprimem”. Resumindo a ópera, gay, sim; feminino, não. Haja machismo invisível aos olhos dos (quase) cordiais.

Nenhum comentário:

Postar um comentário